Projeto de lei do marco temporal é aprovado na CCJ e vai ao plenário do Senado

 PL é 'salada de frutas' de retrocessos, avalia liderança indígena; sessão foi marcada por críticas de ruralistas ao STF

Indígenas rechaçam marco temporal e criticam Congresso por afrontar decisão do STF

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou na manhã desta quarta-feira (27) o Projeto de Lei (PL) 2903/2023, que estabelece o marco temporal das terras indígenas. A aprovação foi alcançada com 16 votos contra 10.

O votação ocorre no mesmo dia em que o Supremo Tribunal Federal (STF) analisa pontos que ficaram de fora da análise do marco temporal, como a indenização a fazendeiros. A tese jurídica foi declarada inconstitucional pelo STF por 9 votos a 2.

O relator do PL 2903 no Senado, Marcos Rogério (PL-RO), que é favorável ao marco temporal, sinalizou que pode abrir mão de outros pontos sensíveis do projeto, como a autorização do plantio de transgênicos em terras indígenas. "É possível na sequência da atividade legislativa se opere o veto nessas questões", disse.

O senador Humberto Costa (PT-PE) defendeu que o Congresso respeite as decisões do STF, que segundo ele "é guardião da Constituição". Na mesma linha, Fabiano Contarato (PT-ES) destacou a falta de presença indígena na discussão do Senado. "É cômodo para nós, homens, brancos, ricos e engravatados, decidir a vida de milhões. Tenhamos o mínimo de empatia", declarou.

Randolfe Rodrigues (sem partido-AP) destacou que o PL 2903 está em contradição com a Constituição e com a derrubada do marco temporal no Supremo. "Isso confronta frontalmente o STF. Porque o direito à demarcação foi a grande conquista da Constituição de 1988", afirmou.

Entre os parlamentares favoráveis ao marco temporal, sobraram críticas ao STF e a ONGs indigenistas. Falando em nome dos povos originários, Zequinha Marinho (Podemos-PA) afirmou que a esposa dele é "neta de índio". "Índio não quer mais terra, ele quer dignidade, quer Hilux", emendou Jorge Seif (PL-SC).

Votaram a favor os senadores Sergio Moro (União-PR), Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), Marcos Do Val (Podemos-ES), Weverton (PDT-MA), Plínio Valério (PSDB-AM), Alan Rick (União-AC), Zequinha Marinho (Podemos-PA), Mauro Carvalho Junior (União-MT), Magno Malta (PL-ES), Marcos Rogério (PL-RO), Rogério Marinho (PL-RN), Eduardo Girão (Novo-CE), Margareth Buzetti (PSD-MT), Esperidião Amin (PP-SC), Mecias De Jesus (Republicanos-RR) e Tereza Cristina (PP-MS).

Senado desafia decisão do STF

Por meio do PL 2903, senadores ruralistas propõem não apenas implementar o marco temporal derrubado pelo STF, mas também legitimar invasões de terras indígenas ao disponibilizá-las, sem consulta prévia aos moradores, ao agronegócio e a grandes empreendimentos, como hidrelétricas, mineração, rodovias e ferrovias.

Entre os retrocessos mais explícitos nos direitos indígenas previstos pelo PL 2903 , está o trecho que diz que "não haverá qualquer limitação de uso e gozo aos não indígenas" que ocuparem territórios indígenas "antes de concluído o processo demarcatório".

Quem avançar sobre terras indígenas terá "garantida sua permanência na área objeto de demarcação". O texto considera todas as construções erguidas na área a ser demarcada como "de boa fé" e, portanto, passíveis de indenização.

"Salada de frutas" de retrocessos

Lideranças indígenas ouvidas pelo Brasil de Fato consideram que a bancada ruralista afronta o STF ao defender o marco temporal, que teve sua inconstitucionalidade reconhecida pela Corte.

Indígenas preveem que o projeto seja aprovado no Senado, em função do apoio massivo que ele recebeu do agronegócio. Após passar pela CCJ, a matéria vai à votação no plenário da Casa, antes de seguir para sanção presidencial.

"Eu vejo o PL 2903 como uma salada de frutas. Pegaram todas as matérias que colocam em risco as vidas dos povos indígenas e colocaram para tramitar sem discussão. Esperamos que o presidente Lula não sancione", afirmou Eliane Xunakalo, presidenta da Federação dos Povos e Organizações Indígenas do Mato Grosso (FEPOIMT).

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