Nubank, a startup que colocou 1 milhão de brasileiros no SPC por causa de R$ 100
Instituição financeira aderiu ao Desenrola e terá de limpar nome dos clientes com pequenas dívidas
O programa Desenrola deve limpar o nome de até 2,5 milhões de cidadãos brasileiros inscritos até o final do ano passado em listas de inadimplentes por conta de dívidas de até R$ 100. O número deve ser atingido já que o banco Nubank resolveu na quarta-feira (19) aderir à iniciativa e, por isso, terá de “desnegativar” clientes cujos nomes foram enviados ao Serasa ou SPC por causa de pequenas dívidas.
O Nubank está entre os bancos que mais sujaram o nome de brasileiros por conta de débitos que, junto com multas e juros, somavam até R$ 100 em dezembro de 2022. De acordo com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), dos 2,5 milhões “negativados” por bancos por pequenos débitos, 1 milhão eram clientes do Nubank –40% do total.
Para a economista e coordenadora do Programa de Serviços Financeiros do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim, o percentual é “escandaloso”. Mais ainda quando considerando o que Nubank representa ao mercado financeiro nacional.
O Nubank tem 73 milhões de clientes, segundo dados do Banco Central (BC). Isso significa que o banco negativou um a cada 73 correntistas por causa de pequenas dívidas.
Os outros bancos que aderiram ao Desenrola – Caixa, Banco do Brasil, Itaú, Santander, Bradesco e outros– têm juntos pelo menos 510 milhões de clientes, dos quais 1,5 milhão tiveram o nome enviado ao Serasa ou SPC por dívidas de até R$ 100. Isso significa que um a cada 340 clientes foi negativado por pequenos débitos.
Vale lembrar que um cidadão pode ter conta em mais de um banco. Por isso, o número de clientes de instituições financeiras supera o número de habitantes do país.
Segundo Amorim, considerando a carteira de crédito dos bancos brasileiros, os números de pequenos devedores do Nubank são mais discrepantes. Os últimos dados do BC indicam que o Nubank tem R$ 36,4 bilhões emprestados a pessoas físicas. Ou seja, tem um pequeno devedor negativado a cada R$ 36,4 mil em crédito fornecido.
Já a carteira de crédito dos outros bancos que aderiram ao Desenrola ultrapassa os R$ 2,5 trilhões. No caso deles, a cada R$ 1,6 milhão emprestados a pessoas físicas, existe um cliente negativado por até R$ 100.
“Eu fico indignada com isso. A negativação inviabilizou empregos, aluguel de imóveis, uma série de situações em que é necessário estar com o nome adimplente”, disse Ione. “É muito escandaloso ver que essas questões são tratadas de forma tão sem importância.”
Segundo Ione, considerando o valor do débito, os clientes negativados foram punidos possivelmente porque esqueceram de pagar um saldo residual de um cartão ou mesmo uma pequena multa por atraso de uma parcela de empréstimo. Ela afirmou que, muito provavelmente, se o banco tivesse alertado esse cliente da forma correta, ele teria se acertado.
Banco diferentão
Fundado em 2013, o Nubank é hoje o maior banco digital – sem agências – do país. Ele cresceu apresentando-se como um banco mais amigável e oferecendo contas e cartões de crédito isentos de tarifas de manutenção.
O economista Miguel de Oliveira, diretor-executivo da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), lembra que os cartões foram oferecidos a cidadãos cujo histórico de crédito era visto como ruim por outros bancos. Parte dessas pessoas acabou, efetivamente, enrolando-se com os serviços e os limites ofertados pelo Nubank. Tornou-se inadimplente.
“O Nubank fez uma campanha extremamente agressiva para trazer clientes. Ele dava um “roxinho” [apelido do cartão da instituição] para todo mundo”, disse. “Agora, há uma quantidade enorme de correntistas nessa situação [devedores].”
“O Nubank tinha um engajamento nessa questão social, de orientação financeira, etc. Essa quantidade de pessoas negativas impacta nessa imagem”, acrescentou Oliveira.
Ione concorda com essa visão de Oliveira. Segundo ela, o Nubank surgiu como uma alternativa ao grande sistema financeiro, visto como um "predador" da renda de brasileiros. Acabou empurrando pequenos devedores para as mãos de financeiras que ofertam crédito a negativados cobrando juros exorbitantes de até 20% ao mês.
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