Colômbia endurece código penal após greve geral e aumenta pena contra manifestantes
Legislação autoriza direito de legítima defesa "privilegiada" e prisão para quem "incitar" violência em protestos
Faltando cinco meses para o fim do mandato, o presidente da Colômbia, Iván Duque promulgou uma nova lei de "segurança cidadã". A legislação seria uma resposta à maior greve geral da história do país, que aconteceu no primeiro semestre de 2021. Oposição e organizações de direitos humanos criticam o projeto por "criminalizar" os protestos sociais.
Entre as principais mudanças está o estabelecimento de pena de 48 a 144 meses de reclusão para quem "atentar contra a infraestrutura de segurança e administração da justiça colombiana"; cria a figura de "legítima defesa privilegiada" para quem pegar em armas para se defender de "agressão injusta"; e criminaliza a posse de armas brancas durante manifestações públicas.
Os líderes sociais poderão ser detidos se comprovado que atuaram incitando a violência. O novo texto também proíbe qualquer tipo de bloqueio de vias — uma das principais táticas da greve geral de 2021.
Duque classifica a medida como uma "sanção exemplar para o vandalismo". Já o ministro de Justiça, Wilson Ruiz, afirma que a lei é uma grande conquista e será "implacável contra a delinquência".
Já o chefe o Ministro do Interior, Daniel Palacios, disse: "é claro que alguns estão em desacordo, mas este é um governo de fatos e com esta lei estamos brindando mais ferramentas aos juízes para sancionar os violentos que perturbam a tranquilidade", assegurando que o texto final é fruto do diálogo entre distintas instituições do Estado. Ambos acompanharam Duque numa cerimônia de promulgação da lei na última terça-feira (25), na Casa de Nariño, sede do governo.
A advogada e representante da ONG Lazos de Dignidad, Martha Isabel Fajardo, critica o discurso oficial. "É uma lei profundamente antidemocrática, própria de governos autoritários e, sem dúvida, criminaliza a manifestação social. Foi construída sob duas premissas: a doutrina da segurança cidadã e a doutrina do inimigo interno, que legitima vários mecanismos para dar mais liberdade à ação da força pública", afirma.
Em 2021, a Colômbia viveu dois meses de greve geral, que iniciou contra o projeto de Reforma Tributária do governo e terminou com uma lista de reivindicações, como o direito à livre manifestação, reforma policial e o respeito aos Acordos de Paz, assinados em 2016.
De acordo com levantamento de organizações de direitos humanos colombianas, cerca de 75 pessoas morreram durante os protestos e em pelo menos 20 casos há indícios de responsabilidade policial nos óbitos.
Além disso, há denúncias de 4.285 casos de violência policial, mais de 300 desaparecidos e 81 vítimas de lesão ocular por disparos das forças estatais de segurança.
Na época a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) visitou o país e no seu relatório final concluiu que houve "uso desproporcional da força" contra civis.
A ONU também emitiu um relatório, em dezembro do ano passado, criticando a violência de Estado e reiterando que pode confirmar a morte de pelo menos 46 pessoas durante os dois meses de manifestações e destacando que 28 óbitos foram causadas pela polícia.
"O texto dá abertura para montagens policiais, criando o delito de obstrução à função pública. O que quer dizer que se nós defensores dos direitos humanos questionarmos a ação policial durante alguma manifestação, ainda podemos ser acusados de estar impedido a força pública de atuar e ser penalizados por isso", destaca a advogada colombiana Martha Isabel Fajardo.
A lei foi aprovada no contexto de aumento da violência no país. Somente nesse mês de janeiro já foram registradas dez chacinas e 12 defensores de direitos humanos assassinados, de acordo com levantamento do Instituto de Desenvolvimento da Paz (Indepaz).
Em março os colombianos terão eleições parlamentares e, em maio, as presidenciais. De acordo com as últimas pesquisas de opinião, o senador Gustavo Petro, do movimento opositor Colômbia Humana é favorito para suceder Iván Duque. Embora classifique o projeto como "populista", Fajardo prevê que "a lei pode desatar uma nova onda de mobilizações, justamente por conta do cenário eleitoral".
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